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Obra “Jornalismo de Bodó”, escrita por um docente e um TAE da Ufam, propõe resistência e crítica na prática jornalística local

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A pergunta fundante que embalou a criação da obra foi esta: “Existe Jornalismo de Bodó?”. O questionamento foi feito, segundo o prefácio da obra, durante um bate-papo entre o apresentador Walquimar Borges e a jornalista amazonense de política Rosiene Carvalho, em setembro de 2024, no canal de YouTube Tertúlia Amazônica. Desse mais de um ano para cá, os autores do “Jornalismo de Bodó”, o técnico-administrativo em Educação Gleilson Medins e o docente Gabriel Ferreira, ambos atuantes na Faculdade de Informação e Comunicação da Universidade Federal do Amazonas (FIC/Ufam), passaram a desenvolver suas ideias em torno da expressão.

O livro está no catálogo das obras lançadas pela Editora da Ufam (Edua) neste mês de outubro. Ele já está disponível para download gratuito neste link, em formato PDF. De leitura rápida e didática, a obra é distribuída em menos de 90 páginas e dispensa a numeração por capítulos. Na primeira parte, os Medins e Ferreira apresentam os antecedentes fáticos e defendem um conceito ressignificado de “jornalismo de bodó”. Em seguida, partem logo para um olhar sobre a prática e acerca de quem se poderia qualificar como “jornalista de bodó”.

Depois abordam a vida do repórter de política, o jornalismo como empreendimento o que chamam de “jornalismo preguiçoso” para marcar em que situação o jornalista vira pauta – quando é alvo de violência. No trecho final da obra, trazem a reflexão da década do curso de jornalismo da Ufam, professora Ivânia Vieira, sobre o jornalismo amazonense. Ela, que foi repórter e editora de política durante muitos anos, enquanto também lecionada na Universidade, compartilha experiências e reflexões com o leitor que, ao final, é apresentado ao termo “folkjornalista de bodó”.

“[...] é um grito de insurgência frente a todo o poder e pretenso direito que algumas autoridades políticas do Amazonas acham que têm sobre a imprensa e sobre o trabalho dos jornalistas. Apesar de ser um recorte regional, a obra também reflete uma faceta do cenário jornalístico nacional (infelizmente). Precisamos discutir cada vez mais se há de fato liberdade de imprensa ou apenas liberdade de empresa neste país. A subjetividade jornalística não pode ser usurpada por "coronéis de barranco". O profissional jornalista é (ou deveria ser) um dos profissionais mais intelectualizados da sociedade. Como o jornalista pode ajudar a sociedade a pensar criticamente o mundo se o seu pensamento não é livre? Se ele não passa de fantoche de político?”, expõe o TAE Gleilson Medins, doutor em Comunicação e atualmente no cargo de coordenador administrativo da FIC.

Docente naquela Unidade, Gabriel Ferreira destaca as várias parcerias costuradas para a elaboração da obra, desde a autoria até os relatos de experiências de outros colegas de profissão. “Eu e Gleilson já desenvolvemos trabalhos nesse sentido há algum tempo. O livro veio de uma inquietação a partir da prática jornalística que nós observamos ao longo dos anos, sobretudo na política amazonense. E nossos esforços se concentram nessa relação tóxica da imprensa com os políticos do Amazonas. Isso acabou aflorando mais ainda depois que o ex-presidente Jair Bolsonaro foi eleito, em 2018, e a extrema direita acabou tomando conta da política [...] e a gente faz discussões a partir de uma cena, um ato de violência contra um jornalista, e vamos trazendo conceitos como ética, direitos humanos, prática jornalística, censura e uma série de questões que perpassam esse fato e acabaram originando o termo, ao qual atribuímos novo significado”, detalha o segundo autor.

Por que “bodó”?

A expressão emergiu das palavras de um político para desqualificar a prática jornalística de um profissional que ousou questioná-lo, como uma “violência simbólica”, conforme informado no prefácio, para fazer um paralelo com o peixe amazônico que vive em áreas enlameadas. Ao ser confrontado com a teoria especializada e com a realidade do jornalismo amazonense, aquele inicialmente pejorativo “jornalismo de bodó” foi ressignificado pelos autores como uma ação de resistência frente às práticas locais que têm considerado “jornalistas como partes no agendamento na cobertura de política, como alvos de perseguições, intimidações, ataques pessoais, censura [....]”. Quem não se lembra do anedótico “Então morra!”, frase proferia pelo então prefeito de Manaus, Amazonino Mendes (falecido em 2023), ainda no ano de 2011, à qual a imprensa assistiu praticamente sem reação e que foi resgatada no prefácio. Em resposta, os autores afirmam: “O jornalismo se faz com coragem também”.

Em síntese, essa obra apresenta um modo de exercício jornalístico combativo, inserido na realidade amazônica e comprometido com a crítica social, fazendo um contraponto ao jornalismo tradicional, geralmente pautado por interesses políticos e econômicos. A abordagem criativa resgata a resiliência e a adaptabilidade do bodó para defender que um jornalismo com essas mesmas características tem plena capacidade de enfrentar um ambiente adverso (a lama da censura e da opressão política e econômica) com coragem e ética. Nessa chave de leitura, os argumentos se alinham à proposta de que o jornalismo deve sim incomodar os poderosos e denunciar injustiças.

Contudo, o livro também reconhece a existência de uma série de tensões permanentes, as quais se revelam (ou nem tanto) por meio de situações de precarização do trabalho e de desrespeito explícito por essa categoria profissional. Inclusive, trazem depoimentos de repórteres como Adriano Santos, o protagonista do episódio que originou o termo “jornalismo de bodó”. Os autores não fogem do atual debate sobre a romantização do trabalho jornalístico informal e o enfraquecimento da profissão nas últimas décadas. Mesmo diante disso, eles continuam a defender que a atuação do jornalista deve se fazer com formação crítica, ética e compromisso com a verdade.

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