COP 30 – Projeto na área de Comunicação aborda as mudanças climáticas como um problema público
“É uma pesquisa sobre públicos, por meio da qual nós buscamos compreender repertórios e formas interventivas de cada grupo em relação às mudanças climáticas”, resume Israel Rocha, coordenador do projeto
Abordar a emergência climática pelo uso de teorias, métodos e indicadores próprios das ciências naturais ou biológicas já é um lugar-comum. E não é que isso seja errado ou ultrapassado, só o problema é mais complexo, envolvendo, por exemplo, modos de intervenção de públicos diversos e heterogêneos, cujos interesses e as ações acabam convergindo para um objetivo comum: a busca de alternativas para mitigar impactos e de soluções adaptativas que garantam a continuidade da vida no planeta.
Conforme explica Israel Rocha, docente do curso de Relações Públicas e do Programa de Pós-Graduação em Informação e Comunicação (PPGIC), ambos da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), cada um desses públicos é formado por atores que aglutinam demandas específicas e modos de agir em que são considerados o contexto social e a posição ocupada, seja como grupo de pressão ou como instância decisória.
O pesquisador lidera um projeto guarda-chuva que reúne um conjunto de planos de trabalho – nome atribuído às investigações menores inseridas no plano de pesquisa mais amplo – tanto no nível de graduação quanto no mestrado. O projeto está em desenvolvimento no âmbito do Grupo de pesquisa Gestão da Informação e do Conhecimento na Amazônia (Gica), institucionalizado na Ufam. Em linhas gerais, o objetivo é compreender como os diversos públicos atuam em relação às mudanças climáticas, por exemplo, veículos de imprensa, governos municipais e estaduais, associações profissionais, coletivos e grupos não institucionalizados, entre outros.
O projeto liderado pelo professor Israel Rocha – e que hoje já se desdobra em dois outros menores, vinculados à Iniciação Científica da Ufam e iniciados em agosto – nasceu de uma proposta submetida ao edital Humanitas de 2022. Por meio dele, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam) seleciona os melhores projetos da área de Ciências Humanas. Naquele momento, Israel se propôs a estudar como a Prefeitura de Manaus e o Estado do Amazonas estavam pensando as políticas públicas para mitigação e adaptação às mudanças climáticas nas respectivas agendas governamentais.
“Na época, nosso objetivo era fazer o acompanhamento de alguns sites dos governos local e estadual em que o tema era tratado”, resume o pesquisador. A pesquisa rendeu publicações científicas; e foi quando ele percebeu o potencial de estender a observação para outros públicos. Assim, o sentido de “público” se descolou da ideia governo para ganhar contornos além, onde novos grupos passariam a ter os seus modos de articulação e os repertórios social e político interpretados pelos pesquisadores.
“Quando estudamos as mudanças climáticas como um problema público, começamos a entender como é que vários atores começam a se envolver com essa questão. Na Universidade, por exemplo, nós temos gente da sociologia, da antropologia, da filosofia produzindo conhecimentos nesse tema”. Essas perspectivas se somam àquelas abordagens mais tradicionais, que vêm das geociências, da biologia, da física...
Numa outra frente, há hoje uma série de atores não institucionalizados que se envolvem nesses debates. Eles produzem relatórios de monitoramento sobre aspectos e territórios de seu interesse, exercem pressão sobre o Legislativo e o Executivo por avanços na legislação e pela criação de programas sobre sustentabilidade e meio ambiente, interagem com outros grupos e promovem ações em colaboração. “A sociedade civil, os grupos de ativistas ambientais, as comunidades tradicionais de ribeirinhos, indígenas e quilombolas, os coletivos de educação ambiental, todos esses atores têm se organizado para mostrar um pouco da situação aqui na Amazônia”, situa Israel Rocha.
Cobertura jornalística da COP 30
Não por acaso, a mobilização dos diversos grupos engajados com o enfrentamento das mudanças climáticas ganhou tração neste ano. Entre os dias 10 e 21 de novembro, a cidade de Belém (PA) sedia a 30ª edição da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025 (COP30). Sendo o Brasil – e uma das duas capitais mais importantes da Amazônia – como anfitrião do maior evento mundial sobre mudanças climáticas, as atividades dos diversos públicos abordados no projeto guarda-chuva do professor Israel Rocha já são intensas, inclusive no sentido de produzir conteúdos e emplacar as pautas de maior interesse para serem debatidas durante o evento.
Um dos dois projetos de Iniciação Científica orientados pelo por ele entre 2025 e 2026 trata de um público relevante na construção das narrativas que circulam a respeito da COP30: os veículos de imprensa. A condução da pesquisa ficará a cargo da bolsista Janaína Freitas, estudante do segundo ano do curso de Relações Públicas da Ufam. Em síntese, ela coletará as publicações nos portais mais relevantes nas cidades de Belém e Manaus, considerando o recorte temporal de antes, durante e depois da Conferência. O material será interpretado a partir da chamada teoria do enquadramento da mídia, por meio do qual é possível identificar quais aspectos estão sendo mais abordados nas notícias em cada momento, gerando insights sobre o público “veículos de imprensa”.
Embora a coleta de dados ainda não tenha iniciado efetivamente, Janaína já tem algumas impressões iniciais sobre como a COP30 está sendo noticiada em portais de notícias das capitais amazonense e paraense. “Aqui em Manaus, eu percebo uma abordagem mais ampliada, que fala da Amazônia como um todo, do bioma em geral; em Belém, nós vemos principalmente notícias sobre a preparação da estrutura, os problemas que decorrem disso, porque é a cidade que vai sediar o evento”, relata a jovem, a respeito de uma linha mais factual observada nos portais paraenses.
De acordo com o cronograma do projeto aprovado, o primeiro passo é a seleção dos jornais (on-line) com grande incidência na região, depois serão levantadas as palavras-chave e será construído um banco de dados desse material selecionado para, por fim, serem feitas as análises e as interpretações do enquadramento. “O cronograma prevê que a primeira parte da coleta seja concluída em setembro, e que já tenhamos condições de fazer as análises parciais enquanto acontece a COP30”, indica o orientador do projeto de Pibic.
Perspectivas
Além dessa, há outras iniciativas no radar do pesquisador Israel Rocha, como o projeto de IC já citado, que vai tratar de um público mais heterogêneo do que a imprensa, incluindo ativistas, comunitários, organizações civis, coletivos de jornalistas, entre outros; e um projeto de mestrado que abordará as queimadas na região. “Mas este outro ainda está em fase de construção junto com a orientanda”, diz o professor.
“Futuramente, queremos pesquisar como as mudanças climáticas impactam, por exemplo, o planejamento de infraestrutura das obras públicas. Por exemplo, ao planejar e construir uma ponte no município, a Prefeitura está considerando elementos de mudanças climáticas? Eles incluem a variação de temperatura e a adequação da obra a essas condições, o uso de materiais biodegradáveis, reciclados etc. Ou seja, é uma virada de chave no comportamento desse público que está pautada na mitigação de impactos e nas medidas de adaptação, do ponto de vista estrutural”, anuncia o docente, ao classificar essa última como uma proposta de mais fôlego, a ser empreendida pelos mestrandos do grupo de pesquisadores que vêm assumindo mais responsabilidades desde 2022.
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