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Amazônia concentra recorde de mortes de quilombolas por covid-19

Publicado: Sexta, 12 de Junho de 2020, 18h23 | Última atualização em Sexta, 15 de Janeiro de 2021, 14h30 | Acessos: 3158

  

Pesquisa da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) aponta que os Estados do Amazonas, Pará, Amapá, Rondônia e Maranhão respondem hoje por 63% das mortes causadas pela covid-19 entre populações mocambeiras e quilombolas de todo o Brasil. Com isso, a letalidade do SARS-coV-2 nesses grupos estudados, residentes em cinco dos nove Estados que compõem a Amazônia Legal, passa a ser maior do que entre os indígenas amazônicos, que estão a morrer na proporção de sete e nove pessoas, em média, a cada 100 infectadas.

O levantamento foi realizado pelo coordenador do Subcomitê de Combate à Covid-19 da Faculdade de Informação e Comunicação da Ufam, professor Renan Albuquerque, em conjunto com seu aluno de doutorado, o historiador Ítalo Ferreira de Oliveira, que realiza estudo longitudinal (de longo prazo) sobre modos de vida entre quilombos da Amazônia Central brasileira desde 2016.

Os pesquisadores sublinharam que a taxa de mortalidade do novo coronavírus (SARS-coV-2) entre o povo quilombola do Norte do Brasil atingiu, com base nos dados do dia 12 de junho, a cifra de 11,5%. O fato é decorrente da desatenção por parte do Estado brasileiro em relação a direitos de mocambeiros e quilombolas enquanto populações tradicionais e cidadãos brasileiros de fato e de direito.

“Na região amazônica se situam atualmente dois terços de todos esses casos de óbitos. São 71 mortes e 44 delas já aconteceram em comunidades quilombolas do bioma. Os dados indicam que a Amazônia brasileira abriga a mais alta taxa de mortalidade por covid-19 para quilombolas de toda a América Latina”, destacou Albuquerque.

Entre as nações vizinhas mais afetadas por infecções e mortes causadas pelo SARS-coV-2 dentre negros aquilombados, os pesquisadores destacam Peru, Equador e Colômbia, que em suas respectivas porções amazônicas registraram um total de pouco mais de uma centena de casos ao todo, com meia dezena de óbitos.

O número de mortes de quilombolas no Brasil, apesar de subnotificado por força do frágil sistema de registros brasileiro, ainda assim é maior que o dobro do anotado nacionalmente, em geral, em termos comparativos. Até a primeira hora desta sexta-feira (12/06), o país registrava 805.649 infectados e 41.058 mortes, o que dá uma letalidade em torno de 5,2%. No caso dos quilombolas, essa letalidade, como foi enfatizada por Albuquerque e Oliveira, é de 11,5%.

“Em comparação com a média mundial de índice de mortes, os óbitos em quilombos brasileiros são até sete vezes maiores”, salientou Oliveira. “As baixas entre quilombolas estão sendo observadas em decorrência de uma política segregacionista, com discurso raciológico, do governo federal, que não implementou um único plano emergencial que viesse a atender a necessidades de alimentação, sanitárias e profiláticas das populações quilombolas urbanas e rurais”, complementou ele.

Segundo afirma o doutorando, que escreve atualmente tese na subárea de estudos sobre quilombos amazônicos, com a flexibilização do isolamento social em centros urbanos amazônicos ― mesmo com a pandemia em franca expansão, o que faz com que o vírus se espalhe para cidades menores e comunidades tradicionais, e nesse caso especificamente destacamos o campo negro, que se encontra em vulnerabilidade social e a margem de políticas governamentais ―, números piores poderão ser anotados no fim de junho.

Os estudos qualitativos publicados pelos pesquisadores que embasaram o relato estão reunidos nos projetos “Expressões da Pandemia” (cinco volumes) e “Quarentenas Amazônicas” (quatro volumes) e podem ser acessados gratuitamente.

 

Variáveis Sociais

Até metade das remoções de casos graves da covid-19, que chegam a ser realizados de avião a partir de comunidades mocambeiras e quilombolas para hospitais em centros urbanos, são infrutíferas e terminam em morte por causa da baixa resistência dos convalescentes. Esses números estão na mesma ordem de registro para indígenas na Amazônia, segundo dados da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).

O problema pode estar ligado a algum fator de suscetibilidade genética que predisponha quilombolas a uma maior mortalidade em função do SARS-coV-2, tal como é suposto para povos nativos ameríndios amazônicos. Ademais, existe a falência estrutural das condições sócio-sanitárias e o racismo institucional em detrimento a esses indivíduos.

Outra problemática se dá no contexto do padrão de incidência sazonal de viroses na Amazônia, que foi um dos fatores determinantes para a alta taxa de prevalência da covid-19 no Norte do Brasil, destoando das demais regiões do país, conforme sugeriu Wanderson Oliveira, ex-secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde em 8 de junho, em entrevista ao biólogo e divulgador científico Atila Iamarino, citando o fato de que no primeiro trimestre do ano o vírus influenza teve alto espalhamento na Amazônia.

Dados que também serviram de base para o levantamento podem ser contextualizados a partir de plataformas como Navmed e Johns Hopkins, além do portal de monitoramento no Brasil de casos e mortes do novo coronavírus entre comunidades quilombolas, midiatizado pela Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) e pelo Instituto Socioambiental (ISA).

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