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Curso de Psicologia encerra ciclo de colações do semestre 2019/1

  • Publicado: Quinta, 26 de Setembro de 2019, 14h35
  • Última atualização em Quinta, 26 de Setembro de 2019, 15h45
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Formandos da Faculdade de Psicologia da Universidade Federal do Amazonas (Fapsi/Ufam), no total de 10, receberam outorga de grau como bacharéis em solenidade que ocorreu na noite de quarta-feira, 25, no auditório Eulálio Chaves, no setor Sul do Campus Sede. O evento foi presidido pelo reitor, professor Sylvio Puga, e prestigiada por familiares, professores e amigos.

Após saudar os demais membros da mesa, os homenageados e, in memoriam, o professor Waldir dos Santos Costa, que recebeu como homenagem o nome da turma, o professor Sylvio Puga falou sobre a construção do prédio da Unidade Acadêmica. “Desde que assumimos a gestão da Universidade, temos trabalhado arduamente para materializar esse sonho, que é de vocês, mas também é de todos nós. A Fapsi é a única Unidade da Ufam que ainda não possui prédio próprio, e nosso objetivo é entregar esse bloco em 14 meses, desde o momento em que forem iniciadas as obras. Já temos o recurso, agora estamos em fase de contratação de uma nova construtora, pois a empresa que estava com o contrato desistiu de fazer. O mais difícil nós já conseguimos, que é o dinheiro”, explicou o reitor, ao reforçar o convite de que os agora egressos voltem à Instituição para dar continuidade aos estudos.

Diretora em exercício, a coordenadora acadêmica da Faculdade, professora Lídia Ferraz, disse do orgulho que é entregar uma turma de formandos tão diversa. Depois de agradecer aos pais, por terem confiado seus filhos aos cuidados da Ufam nessa jornada que durou, em média, seis anos, enfatizou a tendência dos profissionais dessa área para vencer desafios. “Se não gostassem, não estariam na Psicologia, porque é difícil ser psicólogo. É uma responsabilidade e um desafio muito grande. Precisamos o tempo todo aprender a lidar com nós mesmos, com os nossos medos e vocês vão aprender isso no caminho”. Ao final, ela também os convidou para retornarem à Ufam, pois “esta casa está sempre de portas abertas para qualquer momento e para qualquer dúvida”, inclusive para colaborarem na clínica-escola.

Por outro lado, o discurso da paraninfa, professora Ana Cristina Martins, foi sobre os desafios que se colocam, na atual conjuntura, fora da Universidade. “Nós sabemos que se ampliarão ainda mais os processos de exclusão, e essa falta de acesso às políticas públicas deve contribuir para o adoecimento das pessoas, a exposição do preconceito e da violência, as manifestações homofóbicas, misóginas e criminalização dos movimentos sociais, entre outros tantos problemas atuais no Brasil”, explicou e. "É nesse cenário de desmonte onde a Psicologia se faz ainda mais necessária, pois se pauta na valorização engajada dos direitos humanos e sociais, contribuindo para a saúde psíquica da população”, completou a docente.

Orador da turma, o também docente da Ufam e diretor da Editora Universitária (Edua), Sérgio Freire, foi o último a receber a outorga de grau como bacharel em Psicologia. Em seu discurso, usou da linguagem metafórica para ilustrar a importância desse profissional nos dias de hoje. Leia o discurso completo no fim desta notícia.

Lista de Egressos

  1. Bruna Waayen Caleffi;
  2. Cindy Gomes Bezerra;
  3. Clara Mota Wolff;
  4. Danielle Morais Maia;
  5. Kassia Pereira Lopes;
  6. Letícia Souza Reis;
  7. Luana Dias Pena Forte;
  8. Milena Costa Maciel;
  9. Rayza de Sousa Ramos;
  10. Sérgio Augusto Freire de Souza.

 

Discurso do Orador (texto completo)

Hoje é um dia de festa, uma noite de celebração. A Psicologia nos ensinou, no entanto, que quando o sujeito aponta a lua, nós devemos também olhar o dedo. Ela nos fez ver que a janela faz parte da paisagem. A Psicologia nos ensinou que o bordado só se sustenta pelo emaranhado de fios do seu avesso.

Um bordado. É apoiado nessa metáfora que cirzo a minha breve fala nesta noite.

Quando nós vemos um bordado, o desenho reconhecível da linha no linho é a parte visível do trabalho da bordadeira. Para o dia a dia, ver o desenho bonito, colorido e arrumado no pano, é o que interessa. É essa a estética do cotidiano na sociedade da visibilidade, no show do eu contemporâneo, no império da imagem em tempos de Instagram. Mas, como eu disse, para que essa imagem olhada tenha sentido para quem a vê, há muitos fios invisíveis embolados e não tão arrumados que a compõem e a sustentam por detrás do pano. Não há imagem social sem nossos emaranhados particulares. Nós somos o que nós temos sido. E nossos emaranhados ficam do outro lado do pano.

É exatamente na cidade dos fios embolados e desarrumados que nós, psicólogos, moramos e trabalhamos. É aí que circulamos. É aí que manejamos nossas ferramentas teóricas. É aí, na terra dos fiapos da história de cada um, que nós encontramos o Outro. É no outro lado do pano da subjetividade, nas emaranhadas linhas das histórias, que se explicam os comportamentos, as felicidades, as tristezas e as angústias do sujeito.

Se o bordado nos evoca o necessário pensar sobre o outro lado, ele também nos convoca a entender o Outro como uma categoria fundamental do fazer do psicólogo. Já dizia o filósofo Ortega y Gasset: "Eu sou eu e minha circunstância, e se não salvo a ela, não me salvo a mim."

Chamo, assim, a atenção de todos nós aqui presentes para a necessidade de perceber o Outro. Vivemos um tempo no país que apresenta a cada dia exemplos da erosão do Outro, causando uma angústia coletiva que nos faz acordar com uma dor sem remetente no peito todos os dias. O fato do Outro desaparecer é um processo dramático,  que fatalmente tem avançado, de modo grotesco e sem limites, nas falas de ódio e intolerância que a cada dia tomam conta do país nas vozes e nas práticas das pessoas. Há alguns anos discutíamos como gastar o dinheiro do pré-sal em educação e saúde. Hoje estamos debatendo se a morte de uma criança de 8 anos é justificável ou não. Com a licença dos colegas das outras abordagens pela referência à Psicanálise, hoje vivemos numa sociedade cada vez mais narcisista, em que a libido é investida unicamente na própria subjetividade. Há um superinvestimento no eu e um afrouxamento dos laços sociais. Uma sociedade narcisista apaga o Outro, elimina o avesso. Só pensa em si. Acredita que sua imagem se basta. “Narciso acha feio o que não é espelho”.

Então, eu queria virar o pano do bordado do nosso dia de festa para que a gente pense no outro lado. Se nós estamos aqui fazendo parte dos privilegiados 14% de brasileiros com nível superior, milhões de brasileiros não têm acesso a ele; enquanto nós temos uma casa para morar, comida para pôr na mesa, 50 milhões de brasileiros vivem na linha de pobreza: o equivalente a 25% da população de nosso país. Tudo isso, entre outras coisas, por conta de uma distribuição de renda perversa e de políticas governamentais que têm privilegiado os mais ricos e sobrecarregados os mais pobres. Com essas políticas, há um aumento o fosso social. Se temos a alegria de ter famílias bem estruturadas, em que o respeito à diversidade e o respeito à alteridade fazem com que tenhamos não só uma casa, mas um lar, é preciso, no avesso, lembrar que em 2018 foram registrados 1.206 feminicídios no Brasil.

Isso significa que 1 mulher é morta a cada 8 horas. Ano passado, foram 552 mortes por causa da homofobia: 1 vítima de homofobia a cada 16 horas no país. No ano passado ainda, 6.160 pessoas morreram nas mãos da polícia, na sua maioria pretos e pobres. Nessa estatística está a menina Ághata, de 8 anos, que tem estado no noticiário. Um nome, uma menina que sonhava ser a Mulher Maravilha, cuja memória logo vai sumir, virar um mero número nas estatísticas. É uma guerra estúpida que também leva a vida de policiais em confronto e por suicídio, suicídio, a propósito, cuja taxa mundial caiu, mas que teve um aumento de quase 10% no Brasil nos últimos anos. Por quê? Porque, meus amigos, eu sozinho não me basto. Eu sozinho não dou conta. Eu preciso do Outro. O outro é minha circunstância e “eu sou eu e minha circunstância e se não salvo a ela, não me salvo a mim”.

É essa sociedade adoecida, colegas, que vamos encontrar lá fora, quando a festa acabar. Daí a necessidade do compromisso ético por mais acesso à educação pública, por uma melhor  distribuição de renda, por políticas inclusivas quanto a gênero e sexualidade. Porque essas estatísticas que devem nos incomodar,  - e quem com elas não se incomoda pode procurar um de nós depois de formados – essas estatísticas são sintomas. Cabe a nós, agora psicólogos formados pela Universidade Federal do Amazonas, intervir como pudermos, respeitando e acolhendo as diferenças e os espaços da alteridade para resgatar o vínculo com o Outro, para nos tirar dessa crise de empatia em que vivemos. Quando a empatia diminui, a intolerância aumenta e a sociedade adoece. Estamos cada vez menos sendo capazes de nos colocar no lugar dos outros. Precisamos ver a luz do outro, ser a luz para o outro, tentar ver com os olhos do outro, escutar com os ouvidos do outro, sentir com o coração do outro. É isso que vai reduzir o narcisismo e o sufocamento do Outro, uma agenda que nós, psicólogos, devemos pôr em pauta nas trincheiras dos diversos settings profissionais e terapêuticos, onde quer que atuemos.

Volto ao bordado. Somos nós, psicólogos, pois, profissionais do avesso do bordado. Desemaranhar fios subjetivos: eis nossa tarefa. Nosso juramento deve nos acompanhar a cada dia, a cada encontro com aqueles que vêm a nós buscando compreender seus bordados, os seus avessos, os seus desarrumados. As pessoas precisam sair de um encontro conosco melhores do que quando chegaram a nós.

Nosso compromisso é político, é ético e é estético. Nosso compromisso político é com a pluralidade e a diversidade de quaisquer tipos. Na tarefa de nos ensinar isso, a Faculdade de Psicologia da Ufam foi perfeita. Com a política de respeito à diversidade, exercitamos a ética da alteridade - porque cada pessoa tem um rosto, um nome, uma história. Cada pessoa tem seus fios no avesso do bordado. É esse compromisso político e esse exercício ético que farão de nós bordadores também. Bordadores de um mundo melhor, mais plural e, portanto, mais igual, mais justo e, assim, mais feliz. Porque, afinal, foi para isso que viemos ao mundo: para viver a felicidade. E é para isso que estudamos Psicologia: para ajudar os outros a encontrar a sua felicidade por meio da saúde psíquica. O compromisso estético é esse: com uma vida bonita e feliz. Sejamos felizes, então, com nossos panos, nossas linhas, nossos linhos, nossas agulhas. Apreciemos o lindo bordado que tecemos nesses anos de formação na nossa querida Ufam, da qual saímos hoje como profissionais da Psicologia.

Nós saímos da Ufam, mas ela certamente nunca sairá de nós. E jamais, colegas, jamais nos esqueçamos dos avessos que nos constituem e da nossa vocação para a felicidade. Sejamos todos muito felizes. Obrigado e boa noite.

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